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Re(i)público

17 de novembro de 2019 | 14:27

Valdecir Pascoal

A República faz 130 anos. Em essência, ser republicano é praticar virtudes como a probidade, o altruísmo, a coragem, o comedimento, a busca da igualdade de todos perante a lei, é estar cônscio da temporariedade do poder e de que os recursos geridos são do povo. Ser um repúblico, enfim, é liderar pelo exemplo e servir, da melhor maneira, ao bem comum, com transparência e prestando contas dos seus atos.

Permitam-me, caros leitores, volver no tempo para relembrar posturas de um Chefe de Estado que foi um repúblico, um estadista, amiúde esquecido pela nossa costumeira desmemória, que deveria ser inspiração para os que lidam com a res (coisa) pública. Ele governou durante meio século recusando aumento na sua dotação e destinando parte dela a pessoas carentes para cursarem escolas e faculdades; austero, suas contas ficavam à disposição do público e jamais foi acusado de desvios; semanalmente, recebia, em audiências, qualquer um do povo; priorizava a educação, a meritocracia e foi um incansável incentivador da ciência, da arte e da cultura; defendia a liberdade de imprensa e praticava a tolerância; patriota, ajudou financeiramente e participou na linha de combate de uma grande guerra; fazia empréstimos pessoais para custear viagens; elevou o respeito pelo Brasil no exterior; esbanjou serenidade para resolver conflitos internos e garantir a unidade nacional; por fim, morreu sem deixar fortuna.

Como atestam seus biógrafos, Dom Pedro II foi um repúblico na acepção da palavra, e o inusitado é que, sendo monarca, achava que o Brasil haveria de evoluir para uma república. Igualmente singular foi a república ter sido proclamada por um monarquista de carteirinha, o marechal Deodoro. Coisas do Brasil. Contradições da nossa nada “sereníssima república”, para lembrar o sempre atual conto de Machado de Assis. Falando em Machado, ele foi testemunha ocular desse período da história nacional, sendo primordial a leitura dos conselhos de “Aires”, no livro “Esaú e Jacó”.

Os paradoxos continuam a desafiar a república brasilis. Lembro dois deles: a marcante desigualdade social num país tão rico e, nos últimos anos, o extremismo e a babel de incivilidades nas redes ditas sociais. “Povo” contra a democracia? A filosofia positivista que inspirou a nossa república pregava “o amor por princípio, a ordem por base, o progresso por fim”. Certamente fomos lenientes com o verbo do princípio. O esquecimento do “amor” no lema de nossa bandeira é sintomático e explica muito.

P.S.: Não deixem de ouvir a música “Positivismo”, na voz de Noel Rosa.

 Valdecir Pascoal — é Conselheiro do TCE-PE


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